quarta-feira, 15 de junho de 2005

40 dias procurando Luz - Dia 32

Texto Bíblico do dia:

Marcos 14:51 - "Ora, seguia-o certo jovem envolto em um lençol sobre o corpo nu; e o agarraram. Mas ele, largando o lençol, fugiu despido."

O programa de Deus para a minha vida hoje:

Não me desviar da missão.

Meditando:

Sabe aqueles textos bíblicos que você não acredita que nunca prestou atenção? O de hoje foi um deles. Talvez por preferir o evangelho de João eu nunca tenha atentado para esse episódio que Marcos descreve. Certo comentário bíblico sugere que o jovem descrito seria o próprio Marcos, pois não se justificaria incluir um episódio tão trivial na narrativa se não fosse autobiográfico. Mas nada é trivial demais para minha imaginação. Fiquei pensando no texto e me ocorreram algumas nuances dramáticas.

O contexto é muito tenso. Jesus acabara de ser preso, e os discípulos todos tinham fugido com medo. Mas, confusos, alguns seguiram-no de longe, sem querer se arriscar e ao mesmo tempo sem conseguir abandonar Jesus totalmente. O jovem mencionado é um deles, que, no entanto, é descoberto e capturado. Debatendo-se, ele consegue escapar livrando-se do lençol com que estava coberto, e continua fugindo, agora nu. Aturdido, envergonhado, escondido, com frio e completamente só, o discípulo certamente sentiu-se o mais desamparado de todos os viventes (João 20:19). Curioso é ele ter se sentido assim, quando o mestre é quem fora abandonado. Jesus prometera estar com ele e seus companheiros por todos os dias de sua vida, e não falhou em sua promessa. Mas aqueles que se intitulavam seus seguidores, o deixaram na hora da tormenta. No entanto, foram eles próprios a se sentir desamparados.

Algumas situações em na vida nos fazem sentir como esse jovem: completamente despidos. Tudo que construímos, tudo que conquistamos, toda a aparência de felicidade, todas as ilusões materiais e físicas, todo dinheiro que juntamos, todo conhecimento que acumulamos, de repente, não passam de um frágil lençol arrancado pela força da tormenta. "Porquanto dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um coitado, e miserável, e pobre, e cego, e nu" (Apocalipse 3: 17 ). O que se observa sempre que surge uma situação dessa a um ser humano é que a primeira pergunta, "Senhor, será que eu não poderia ter feito algo para impedir isso?", e o reconhecimento da própria impotência que se segue, faz logo com que surja uma nova pergunta: "Senhor, será que Tu não poderias ter feito algo para impedir isso?"

Os discípulos, acostumados a ver Jesus realizar milagres tremendos certamente se perguntaram isso ao vê-lo morto na cruz. Um pai que perdeu a família enquanto ia para a igreja num acidente de carro causado por um motorista bêbado, também. Muitos de nós, ao ver as cenas das guerras e desastres naturais que passam na TV, também perguntamos. E essa pergunta incômoda é sempre seguida por uma sensação de desamparo enorme, como se Deus tivesse saído de férias e perdido o controle da humanidade.

É aí que alguns fazem o que Adão fez: fogem e se escondem. Adão, o jovem acima citado e algumas pessoas que deixaram a fé têm muito em comum: viveram grandes tragédias, ficaram nus, fugiram e se esconderam, colocaram a responsabilidade do ocorrido sobre outro ser, e principalmente, deixaram a Deus. Essa é uma das escolhas que o ser humano tem quando se decepciona com Deus. "Ele poderia ter feito alguma coisa para impedir", "Ele poderia ter feito do jeito que eu estava pensando, e tudo daria certo", "Ele não cumpriu as promessas que pôs na Bíblia a respeito da proteção e vitória que daria a seus servos". Deus vira um ser desatencioso, para não usar adjetivos piores, e sobre Ele recaem a culpa de todas as desgraças, como se elas acontecessem por vontade dEle. Alguns, tentando consolar, só o afirmam categoricamente: "Não fique assim, foi a vontade de Deus."

Não é vontade de Deus que nenhum de seus filhos sofra. Por isso nunca, nunca mesmo, Deus os abandona. Ele esteve presente em todos os momentos da história, seja através de grandes sinais, seja através dos profetas, seja pela encarnação do Seu Filho, seja pela atuação do Espírito Santo. No entanto vivemos num mundo onde forças malignas trabalham arduamente para semear a destruição, e o próprio homem é, muitas vezes, joguete de Satanás para causar dor aos semelhantes. Diante de um mundo onde o pecado abunda, Deus atua influenciando, nunca forçando decisões. E algumas pessoas simplesmente ignoram a influência divina, preferem fazer o que é errado, e para cada erro há uma conseqüência. Agora imagine o resultado de todos os erros da humanidade através de milênios: é isso que vivemos hoje. É claro que Deus quer dar um basta nisso e corrigir tudo, mas Ele é sábio demais para fazer isso aleatoriamente, por isso segue um plano perfeito, com começo, meio e fim. Enquanto o fim não chega, com a vitória absoluta do bem, Ele administra o mundo dando poder e força para aquele que decide crer.

A outra decisão que temos diante das tormentas que não têm explicação é confiar. Se não confiarmos quando o silêncio de Deus é duro de ouvir, "para onde iremos" (João 6:68)? O que a falta de confiança nos dará de melhor? Que vantagem há em abandonar a Deus? Se decidirmos confiar ainda, crer que no fim Ele nos dará a vitória e está trabalhando para isso independente de quão desesperadora a situação pareça, talvez a nossa dor não diminua muito. Mas Deus fará com que da tragédia nasçam bênçãos. Pessoas podem ser influenciadas por seu testemunho. Outras podem repensar o próprio relacionamento com Deus e seus semelhantes a partir da sua tragédia pessoal, fazendo com que novas tragédias não aconteça. Que motorista se atreverá a beber antes de dirigir ao conhecer a história daquele pai que perdeu a família? Que mãe se atreverá a abortar sua criança com síndrome de Down ao ouvir a história de uma mãe que descobriu alegria ao cumprir essa missão? Que preconceito subsistirá entre um pai branco e um pai negro que perderam seus filhos no mesmo acidente? Mais uma vez repito: decidir crer não consertará as coisas, mas pode ser uma enorme fonte de bênçãos para outros e trará algo que jamais se encontrará fora da fé: a Esperança.

Jó, quando diante de várias desgraças seguidas, pronunciou uma frase intrigante: " Nu saí do ventre, e nu voltarei.O Senhor deu, e o Senhor tirou; bendito seja o nome do Senhor." (Jó 1:21) Ele foi um homem que, mesmo nu, decidiu crer. Se decidirmos fazer isso também, poderemos voltar ao ventre e experimentar um novo nascimento em Cristo Jesus. Mesmo as piores situações podem redundar em vida quando não nos desligamos da fonte da vida. Podemos fazer da nossa dor e dúvida, degraus para crescermos espiritualmente, ajudarmos outras pessoas e alimentarmos a esperança de um novo céu e uma nova terra, onde seremos seres perfeitos vivendo num mundo perfeito. A busca da perfeição, no entanto, começa aqui, e mais êxito alcança quando perseguida através da renúncia do próprio eu, da própria vontade, da própria lógica, da auto-suficiência. Na dor de nos sentirmos nus e desamparados Deus encontra uma oportunidade de voltar a nos colocar nos braços como bebês. Não temos força para resistir ao Seu amor impedir que Ele realize sua obra em nós. Deus, que viu o próprio Filho morrer, conhece exatamente o significado da palavra dor. Cristo, que morreu por nossa causa, sabe o que é sacrifício. Confiemos, pois, que um dia entenderemos completamente seus desígnios, teremos nossa felicidade restaurada por inteiro e, vestidos da Sua justiça, ouviremos: "Estes são os que vêm da grande tribulação, e lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do Cordeiro." (Apocalipse 7:14)

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