domingo, 29 de abril de 2001

Sobre o besouro do p.s,

Cheguei a pensar que não iria acabar nunca, mas o período de provas da primeira unidade na faculdade teve fim. Depois de noites mal dormidas e horas infindas sofridas na leitura exaustiva de livros enormes, eu cheguei ao fim desta semana me abstendo de ler até outdoor. Estava disposta a passar um bom tempo em estado de desinformação total: jogar banco imobiliário, assistir um vídeo de comédia, andar pelo shopping, talvez chegar ao cúmulo de ver TV no domingo... . Mas como esse roteiro me deixasse com a estranha sensação de morte iminente por tédio, eu fiz uma trégua com a leitura e despenquei numa rede, com um pote de sorvete de coco de um lado, e do outro um livrinho simples, sem pretensões intelectuais, fininho e próprio para ser folheado aleatória e despreocupadamente.

Trata-se de "P.S.: eu te amo", do escritor H. Jackson Bronw Jr. Eu o ganhei de presente há muito tempo, mas ainda não tinha me detido para o ler na íntegra. Trata-se de uma compilação que o autor fez de todos os "post scriptum" das cartas que sua mãe lhe enviou ao longo da vida. Segundo as palavras dele, ela sempre deixava o melhor para o final, e neste pequenino espaço escrevia grandes conselhos e observações inteligentes, sempre acompanhados da afirmação do amor materno.

Acho que isso é que faz este modesto livrinho se destacar entre os livros de pensamentos do gênero: o "post scriptum", via de regra, tem um conteúdo intrigante, e costuma ser a parte mais significativa dos e-mails que recebo. Isso faz parte de uma regra geral infalível: você deve tomar nota cuidadosa de tudo que lhe for dito de passagem... o que importa só é dito depois da primeira conjunção adversativa (mas... porém...) e um discurso inteiro não vale a sua conclusão.
Um dos "P.S.s" da senhora Brown que me chamou atenção, dizia: " Pelas leis da aerodinâmica o besouro não pode voar. Esqueceram de dizer isso para ele!"

E é apenas sobre isso que eu queria que você meditasse no início desta semana: quais são os limites que você tem se imposto? Os limites forjados pela voz de quem te deprecia, e diz que você não pode, que não vai conseguir, que deve tentar outro caminho, que já não há chances, que você é incapaz e seu caso, sinto muito, não tem solução? Pior: terá você feito dessa, a sua própria voz? Ou seus limites são ditados pela voz da vontade divina? Se for assim, não tenha dúvidas que Deus sempre estabelecerá o melhor alvo para você. Isso mesmo, inclusive aquele ali, que você tem medo de ir buscar.

Eu estou certa de que há momentos na vida em que nos sentimos fracos, e por uma razão ou outra somos levados a crer nessa voz castradora aí de cima. Mas por que se acorrentar à incapacidade, se você tem aos seu dispôr um Espírito Santo e Poderoso para te transformar num ser vitorioso em todos os sentidos? Se você reconhecer isso, seus problemas não vão desaparecer, mas você vai lidar com eles de forma diferente. Muitas vozes continuarão falando de nossas fraquezas e limitações "...mas o povo que conhece ao seu Deus se tornará forte, e fará proezas." Daniel 11:32.

Uma semana iluminada!

Luna

domingo, 22 de abril de 2001

Possibilidades

Olá amigos,

Os que convivem comigo hão de concordar: em se tratando deimaginação, a minha só é superada pelo vôo do condor. Essacaracterística foi alimentada principalmente em minha infância,quando a ausência de um monte de coisas foi terreno fértil para estamente alada. A escassez de livros me fez escrever os meus próprios, afalta de brinquedos industrializados me fez inventar jogos ebrincadeiras, a dificuldade financeira me fazia aproveitar tudo queeu tinha ao meu alcance como matéria-prima de sonho. Afinal, serfeliz era uma urgência. Curiosidade, criatividade, lápis, papel emais umas bugigangas eram o suficiente para eu construir reinos eaventuras em meu quintal.

Por isso olho com certa tristeza essa tendência moderna de tornartudo muito óbvio, prático, real. São poucos os brinquedos e a culturaque estimulam a imaginação das crianças, as quais ficam adultas cada vez mais precocemente – tem coisa mais triste que uma criança de cinco anos tecendo discursos sobre sexo, pena de morte (uma malufista!!) e germes, como se a realidade dos telejornais fosse amais óbvia e única verdade? Outro dia, num consultório médico, vi uma cena dessas e enquanto a mãe sorria orgulhosa eu controlava minha vontade vomitar (e o médico nem era um gastroenterologista).Talvez por nos acostumarmos com o óbvio, desconheçamos as nossas possibilidades. Vejam por exemplo aquele grupo numeroso reunido ali,ao pé do monte. Por alto dá para contar umas quinze mil pessoas entre homens, mulheres e crianças, muitos cansados e todos com fome ,reunidos em torno de um único Homem. Este povo o seguia em busca deconforto espiritual, porque tinham ouvido falar de como Ele curava e pregava pelo poder de Deus. Mas também precisavam fartar sua fome física.

Simples, tragam a comida!. "Mas não há comida.", você responde.Olhe de novo, tenha mais cuidado dessa vez. Tem certeza que não hácomo alimentar essa multidão?"Bem, pode-se fazer uma vaquinha e comprar algo, mas mesmo assim vai ser preciso juntar um monte de dinheiro!!"Pois eu acho que há outra solução. Fuja do óbvio e use a imaginação,amigo! Olhe aquele rapaz ali adiante. Você não prestou atençãonele.

"Tá bom. Tou vendo. Ele tem cinco pães e dois peixes, agora o quevocê sugere? Nem distribuindo só o cheiro ia dar para tanta gente.Faça o favor de ser prático e dar uma solução mais real, porque não temos muito tempo para ficar brincando, o problema está aí!"Não acho. Você olha para cinco pães e dois peixes e vê um problema.Eu olho para os mesmo cinco pães e dois peixes e vejo possibilidades.Vejo gente com a fome saciada e comida sobrando para outra refeição.Consegue enxergar agora? Leia João 6: 1 – 14.

Uma das qualidades que mais admiro em Deus é Sua criatividade. Como bom artista, ele ousa fugir do óbvio para agir em nosso favor. Se temos fé para permitir isso, é outra história.Seja um entusiasta do poder divino. Durante esta nova semana, olhe com mais atenção o que você tem em mãos e se pergunte o que você e Deus podem fazer com isso. Não se espante em descobrir que, onde antes você via um problema, apareçam possibilidades estimulantes,soluções surpreendentes e até aquela tão sonhada paz. Aí sua semana será realmente iluminada ;-)

Luna

domingo, 15 de abril de 2001

Uma ovelha em três vozes (Handel)

Olá amigos iluminados!

Eu já falei para vocês o quanto gosto de Handel? Só não afirmo que ele é meu compositor favorito porque também sou fascinada pela exuberância de Bach, a expressividade de Vivaldi, e a "mediocridade" de Mozart (o garante minha querida e saudosa amiga Renata). Se a minha vida pudesse ter trilha musical (tenho esta neurose), George Frideric Handel fulguraria em destaque nos créditos, tanto me identifico com sua música.

Eu estava aqui prestando atenção numa das muitas belas árias compostas por ele, que também é uma obra-prima teológica pelo simples ajuntar de dois versículos. A voz de uma contralto (as contraltos são formidáveis) desabrocha no meio de violinos e canta: "Como pastor ele apascentará o seu rebanho; entre os seus braços recolherá os cordeirinhos, e os levará junto ao peito; as que amamentam, ele as guiará mansamente." (Isaías 40:11). Chegue mais perto e repare: o pastor agora está sozinho, e tem o olhar fixo no horizonte, onde busca uma ovelha. Por um momento ele interrompe a caminhada, para e suspira. A voz soprano que estava agachada a contemplar a flor da voz contralto, toma-a nas mãos, levanta-se três tons acima e diz: "Ide a Ele, todos os que estais cansados e oprimidos, e Ele vos aliviará.. Tomai sobre vós o Seu jugo, e aprendei dEle, que é manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas." (ver Mateus 11:28, 29).

E agora eu ouso ir além, fazendo um arranjo nessa harmonia tocante. Quero ver a ovelha que o pastor procura. E sabe o que vejo? A ovelha de Lucas 3:4 – 6, aquela famosa ovelhinha perdida.
Quero que você imagine-se no lugar daquele pastor. Ele amava suas ovelhas, e tanto cuidava, dava carinho e atenção que estas já lhe conheciam pela voz. Mas uma dessas ovelhas sumiu, deixando-o preocupado, temeroso e decepcionado. Imagino esse pastor andando pelo deserto, fazendo sua voz ecoar nas montanhas pedregosas em busca de sua preciosa ovelha perdida. Mas parece que quanto mais a busca, mais a ovelha se distancia dele. O sol lhe queima a face ansiosa... ele começa a sentir sede e fome. Seus pés doem, mas ele continua a andar e – estranho – seu semblante transmite ânimo inabalável, sua voz firme não deixa de ser doce enquanto diz: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei... e achareis descanso para as vossas almas"

Consegue perceber que enquanto procura a sua ovelha perdida, o pastor chama para si não só ela, mas todos os que estão cansados e oprimidos? Pode imaginar que, naqueles vales desérticos talvez hajam outra ovelhas perdidas precisando dos braços amoráveis do pastor, onde possam descansar junto ao seu peito? Nota que mesmo fatigado da busca, decepcionado com a perda de sua querida ovelhinha, e sem certezas de que tornará a vê-la, ele persiste em ser pastor acolhedor a toda criatura que cruze seu caminho? Você enxerga que este pastor não se ocupa das próprias lágrimas, mas persegue com teimosia um alvo, sem jamais duvidar de sua capacidade de amar, sem questionar se vale a pena tamanha jornada pedregosa por causa de uma simples ovelha?

Olhe para sua vida e pense nas coisas que você perdeu. Talvez você saiba exatamente o que faz falta, a saudade precisa do que um dia foi tão seu, tão você, a dor de uma ausência bem conhecida: algo que se perdeu de dentro de você. Talvez você nem tenha parado para se dar conta das perdas que carrega como fardo vida afora. Algumas pessoas preferem não pensar muito na forma como perderam a pureza ingênua, a esperança de melhorar as coisas erradas ao redor ou em si mesmo, a capacidade de amar e confiar sinceramente no ser humano, até mesmo a crença num Deus presente e amoroso e num novo mundo transformado, muito embora essas perdas se acumulem formando rugas no espírito de quem as leva.

O que eu desejo para mim e para todos aqueles que sofreram grandes perdas e decepções, é que assumam a postura daquele pastor. Não desistir de ir atrás do que se perdeu. Se isso lhe pertencia, era parte de você, então é extremamente precioso e deve voltar ao seu verdadeiro lugar. Não podemos nos sentir felizes se estamos incompletos, portanto continue procurando o amor, a amizade, a confiança, a fé, a crença. Se você fizer isso, vai estar você mesmo voltando para o seu verdadeiro lugar, pois o caminho pedregoso dos que lutam por reconquistar a felicidade, vai dar na Nova Terra, onde finalmente encontraremos tudo que um dia fomos, e que se perdeu nesses milênios de pecado.

Continue buscando. E não siga cabisbaixo e murmurante, não se isole no vale de sua dor; vá oferecendo amor e sorrisos a todos que cruzarem seu caminho. Enquanto procura sua ovelha perdida, dê o abrigo de seus braços aos que seguem cansados e oprimidos, seja alívio e descanso para os outros que estão perdidos. Você estará recuperando muitas ovelhas preciosas que a humanidade perdeu. Seja manso e humilde de coração, e você já terá achado algo muito importante: companhia para dividir o peso do jugo, e ajuda para buscar e comemorar a volta da sua ovelhinha.

Uma semana cheia dessa melodia luminosa,

Luna

Ps.: Tuca, esse é o tipo de verdade que a gente sabe mas insiste em esquecer na primeira lágrima. Alguns nos oferecem um lenço para enxugá-la; e nosso olhar só fica mais encoberto e detido na dor. Outros, sem perguntas, nos tomam pela mão e andam conosco até o melhor caminho, deixando que a lágrima seque ao vento; e nosso olhar se abre para horizontes cheios de vida. Obrigada, você é um grande amigo.

Ps2.:Ária do oratório "O Messias" de Handel.

segunda-feira, 9 de abril de 2001

Hora do banho

Ele me fala do que anda fazendo, dos planos em que tem investido,pergunta se eu já reconheci que ele sempre teve razão. A princípio euolhava enfastiada aquela pessoa que eu transformei num ilustredesconhecido, mas que ainda insistia em ser estranhamente conhecedorde mim. Nós namoramos quase quatro anos, brigamos dois terços dessetempo, o outro terço passei desenhando a planta da nossa casa quenunca veio a existir. Terminamos nosso relacionamento por um monte deporquês vagos, e agora, enquanto ele falava eu ficava ali avaliando oque sobrou depois de tanto tempo. Percebi que o que ficou de maisbonito, foram as mesmas coisas que desaprendemos a cultivar: nossasconversas. Eu adorava quando ele se permitia tirar a capa de "machão"e falar dos seus sentimentos... e por gostar de vê-lo assimvulnerável, sempre me emocionava quando ele falava do pai. Era quandoeu sentia mais prazer em chamá-lo de "meu lindinho".

Quando criança ele costumava sair para brincar com os amigos na rua,e como todo garoto de subúrbio, o prazer estava na molecagem dessasbrincadeiras. Sua casa fica próximo ao Rio Potengi, e a aventura maisemocionante naquela época era ir fazer estripulias na lama domanguezal. Ali, naquela selva inóspita, eles exploravam fauna e florasem compromisso ecológico... ao fim da tarde estavam completamentecobertos com a lama escura, só os olhinhos lembrando um ser humano.Mas havia um problema... o pai dele era muito severo, e já o proibirapor diversas vezes de ir brincar no mangue. Era perigoso, e caso aordem fosse desobedecida... bem, aqueles olhinhos ficavam maisarregalados ao pensarem nisso. A solução encontrada pelos meninos erasair do mangue e correr para o campinho de futebol. Lá eles deitavamno barro e se espojavam na terra até que ela aderisse completamente àlama e tirasse o odor característico dela. Chegando em casa, ponta depés, ele entrava de fininho. Quando (quase sempre) o pai via aquelacoisinha barrenta, chegava perto, cheirava-o e perguntava por queestava sujo daquele jeito. Ele respondia que estivera jogando nocampo de futebol... e o pai, com o olfato confundido, o mandava tomarum banho bem tomado senão... e os olhinhos tornavam a se arregalar...

Lembrei de alguém na Bíblia que também gostava de lama. Naamã era orei da Síria: poderoso, grande estrategista militar e conquistador demuitas terras e povos. Mas apesar da aparente glória em que vivia,Naamã se revolvia na lama de seus próprios pecados, e saboreava issocom imensurável prazer. Mas havia ali um cheiro que o incomodava, umtriste cheiro de lepra. E quanto mais Naamã tentava esconder adesgraça por debaixo daquela aparência de glória, pior era. Ele punhaum sorriso nos lábios e dava festas em comemoração àquela vida cheiade prazeres, se cobria de honras humanas e satisfações materiais, mastudo isso era como espojar-se no barro... podia-se até esconder aignomínia da lama embaixo daquela camada superficial de felicidade.Mas tudo que ele conseguia era ficar mais e mais sujo. Quandoconfrontado com a gravidade de seus pecados, Naamã se cobria com maisbarro das glórias humanas e achava que ninguém iria reparar. Ninguémia sentir o cheiro da podridão que o consumia lentamente. Mas chegouum tempo em que suas deformidades estavam ficando impossíveis de serescondidas.

Pensando no que poderia ser seu fim e vendo que ele se aproximava,Naamã sentiu-se desesperado. E cedeu a uma esperança mínima, saídados lábios de uma pequena garota israelita que ele fizeraprisioneira. Agora chegara o momento de Naamã encarar o Deus Pai TodoPoderoso.

A primeira coisa que Deus fez foi colocar aquele filho teimoso em seudevido lugar. Eliseu, o profeta do Senhor, sequer o recebeu, mandouapenas um recado, e o recado de Deus era: "Naamã, enquanto vocêinsistir em viver na lama que tanto te apraz, eu não poderei fazernada por você, a própria podridão te devorará aos poucos. Que realmente se livrar do cheiro da lama? Abandone então o barro de suaspróprias vontades e limpe-se! Lave-se para tirar toda essa crosta desujeira que se acumulou no seu espírito! Vai ao Rio Jordão e mergulhalá sete vezes!"

"Sete vezes?", pensou Naamã, "Ora, que desaforo. Venho de longe embusca deste Deus, e Seu profeta nem me recebe, nem me falapessoalmente, só me manda o recado. E depois me manda ao rio dosisraelitas, quando há rios bem melhores e mais bonitos na minhaterra. Não poderia eu lavar-me neles e ficar limpo? Tem que ser nesserio de... Israel?!" e fez uma cara de nojo. "No mais, por que tem queser sete mergulhos? Esse Deus não tem poder para me tornar limpo sócom um mergulho??"É Naamã... mas as coisas estão em desvantagem para você. É você quemestá sujo. É você quem precisa de cura e agora, pois pode perder seuespírito. São seus os sofrimentos a amargar por causa dos seus enormes pecados. Por isso reconheça sua impotência e faça o que Deuslhe pede. "Por que Ele não desce do Céu para me falar pessoalmente?Se eu sou mesmo importante para Ele, por que não Ele não me recebefrente a frente e diz exatamente o que devo fazer, de maneira clara?"Bem Naamã, Ele mandou o recado, está nessa Bíblia aí do seu lado. "Mas eu tenho ir mesmo a essa Igreja cheia de homens imperfeitos, cujos membros já me decepcionaram, onde muitos pastorese membros fazem coisas erradas, e há um monte de pecados e falhas portodos os lados?"

É Naamã, é aí mesmo que você tem de ir! Sei que vocêdeve ter em mente rios de água mais cristalina, mas é nesse rio deIsrael que você deve banhar-se. "E tem que ser todos os mandamentos?Cumprir um por um, todos os preceitos bíblicos? Não poderia apenas resumir isso em duas ou três regras, e mais uma porção de frasesfeitas para estar limpo?" Sinto muito Naamã. Quem tropeça num sóponto é culpado de tudo, se Deus quer que você siga todos osmandamentos, são todos.

Naamã decidiu ir ao Rio Jordão e deu sete mergulhos. A medida que iamergulhando, deixava ali cada um de seus pecados: o orgulho do bravoguerreiro, a idolatria ao seu deus Rimom, o preconceito para com osoutros povos, a arrogância de sentir-se o único sábio e rei de simesmo, a injustiça de seus procedimentos, o egoísmo... e no sétimomergulho, Naamã afogou o próprio Naamã. Com o Eu submergido naquelaságuas, aquele homem pode renascer, liberto do pecado e curado de suasenfermidades físicas e espirituais. Naamã agora vivia, sabe o que éisso? Agora sim ele era feliz de verdade. Sem ter de cobrir-se dobarro das aparências e inúteis tentativas humanas, ele sorria porcompleto e cheirava a novo. E você sabe como é bom cheirinho de coisanova! Por que não experimentamos agora sermos o que Deus sempresonhou sermos? O que conseguiremos sustentando nossa lepra escondida?Até quando lama e barro vão nos encobrir a glória de sermos chamadosfilhos de Deus?

Uma semana iluminada!

Luna

domingo, 1 de abril de 2001

Enquanto eu achava que tinha perdido a lente de contato... de novo.

Alguns seres humanos convivem inexplicavelmente bem com a adrenalina. Correm perigo, vão aos limites de sua capacidade. Por isso, uns escalam montanhas, outros saltam de pára-quedas, outros ainda esquiam de alturas vertiginosas, pulam de cima de prédios amarrados por cordas elásticas... e eu, uso lentes de contato.

Se você acha que esse é um hábito desproporcional em relação aos demais citados, meça o nível de adrenalina em alguém que tem de enfiar um corpo estranho de flúor-carbonato nos olhos todos os dias. Depois observe como esse pobre ser passa o dia inteiro se precavendo de perigosos grãos de areia que ninguém liga, tenebrosos ventos capazes de lhe arrancar as coisinhas dos olhos, onde os outros só sentem uma leve brisa, e aterrorizantes ar condicionados, que todos insistem em aumentar a potência, enquanto a pobre alma tem seus globos oculares ressecados até expulsarem as lentes.

Incompreendida é a sina de quem usa essas torturas oftalmológicas por obrigação, como é meu caso. Mas nada se compara a observar a estranha e inexplicável tendência que as lentes de contato têm para alçarem vôo quando eu as tento colocar nos meus olhos. Isso que faz a experiência de usar lentes, ser uma fonte de tensão constante: a possibilidade de ver R$ 300,00 indo parar no obscuro e insondável ralo da pia; a versão do "underground" de Hamlet para lentes de contato, o lugar de onde não há volta.

Ano passado eu descrevi para vocês um desses vôos desesperadores, que ocorreu exatamente no meio de um black-out. Esta semana, me deparei com a mesma sensação. A lente já estava quase no olho, quando minha pálpebra piscou bem em cima dela. No segundo que se seguiu, um gelo percorreu toda minha espinha... ouvi nitidamente o barulhinho da lente batendo duas vezes, uma na pia, e outra no chão.

E logo em seguida, estavam eu e minha irmã naquela cena antológica: tateando cada centímetro cúbico do piso do banheiro, sem achar nada. Como já estava atrasada, fui para o estágio e deixei minha irmã naquela missão nada agradável. Passei a tarde diante do computador digitando números e orando... já havia passado por situações idênticas antes, e sabia que só um milagre poderia fazer aquela lente ser achada. E eu esperava por isso, embora também me preparasse para enfrentar mais uma temporada de enxaquecas e visão anuviada (ainda estou pagando as prestações desta última lente suicida).

Bem, deixe-me aí na frente do computador no escritório e venha até ouitro computador, no meu quarto. Não se preocupe, fique a vontade e pode bisbilhotar. Ligue o computador e abra, despretensiosamente (acidentalmente para os mais pudicos), minha caixa de e-mails. Você encontrará uma pasta chamada "interessantes", que é onde guardo os e-mails que acho mais significativos, para serem salvos e catalogados posteriormente... é uma versão virtual de bolsa de mulher. Entre poemas, textos jurídicos e teológicos, você verá alguns e-mails pessoais. Veja o que diz este, de um certo amigo, depois de meu desfile de lamúrias: "...Mas não esqueça que a cada instante há um milagre acontecendo. Você só precisa abrir o olho para ver".

Nunca senti tanta paz em menos de vinte palavras do que quando li essas palavras. Eu vivia uma daquelas situações em que você sente que só um milagre divino pode intervir a seu favor. Que sua dor é muito grande e ninguém pode entender a dimensão de seu sofrimento. Que seu problema é o mais importante agora, e até os conflitos no Oriente Médio não são tão trágicos quanto ele. Você sabe os motivos para estar desanimado, e não minimiza a grandiosidade da solução: precisa de um milagre, de uma saída específica, clara e eficaz. Mas não tem como buscá-la, precisa ser conduzido por Deus até lá, e essa impotência lhe cansa ainda mais.
Os olhos ficam tão fixos na própria angústia que deixam passar despercebidos os pequenos milagres que Deus está fazendo neste momento. Enquanto Ele está providenciando a melhor solução, continua cuidando de você, que está muito desolado para percebê-lo. E muitas vezes, tão convicto de seu problema, você acaba deixando passar o milagre que tanto queria, que pode estar bem aí, na sua frente, do seu lado, esperando que você o perceba e o acolha em sua vida.
Acho melhor você sair da frente do computador do meu quarto porque tem alguém abrindo a porta e acho que sou eu que acabei de chegar...

Meu semblante abatido se deve ao fato de minha irmã ter acabado de me dizer que não encontrou a lente de contato, como eu tanto desejava. E dos cálculos orçamentais para os próximos meses, que se me afiguram bem mais "apertados" do que eu havia previsto. Sento-me na frente do computador onde você estava ainda há pouco (sem notar que você o deixou ligado na ânsia de se esconder atrás da porta), e começo a responder meus e-mails. Já está tarde, e vem o primeiro bocejo anunciando o sono...sinto as pálpebras cansadas e esfrego os olhos, quando de repente...ei, o que é isso arranhando no meu olho esquerdo???? Sim, minha lente está lá, no meu olho, esteve o tempo todo lá!!! Mas espere, então o que foi o barulhinho que ouvi no banheiro quando pensei que ela tivesse caído? Por que não senti o olho arder e lacrimejar como sempre sinto quando ela adere à minha córnea? Por que não senti o vento e o ar-condicionado incomodarem este olho como normalmente o fazem? Eu não perceberia que estava enxergando melhor durante o dia, se a lente estivesse mesmo o tempo todo ali?

Não é minha intenção aqui tecer discursos fanatizados sobre milagres. Muito menos quero destilar polêmicas: sei que existem tantas explicações para este fato quanto há ciências no mundo, e não é preciso pertencer a comissão de canonização do Vaticano para também elaborar as mais diferentes teses para o acontecido...

Minha intenção é apenas reafirmar o que disse acima: o milagre que você espera tanto pode estar acontecendo agora, pode estar diante de você sem que você ainda não tenha conseguido senti-lo, não permitindo portanto vivê-lo. Não espere por luzes incandescentes descendo do Céu em sua direção, anjos luminosos com a resposta exata e uma varinha (espada?) de condão, grandes prodígios, um aperto comovente no coração seguido de visão miraculosa... Deus tem caminhos diferentes e sábios para atuar em nossas vidas, alguns incompreensíveis, outros com aparente lógica, milagres são apenas mais um modo de Deus nos falar, coisas simples, tão simples quanto a paz que vem da certeza que Ele está agindo em seu favor exatamente agora. Você é capaz de aceitar isso?

Continue orando, confiando na vontade de Deus para você. "...Mas não esqueça que a cada instante há um milagre acontecendo. Você só precisa abrir o olho para ver".

Uma semana iluminada!

Luna