quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Adveniat - Tu me amas?

Cito Alberoni outra vez porque seu livro é mesmo instigante. Pretendo ler outros títulos dele, mas "Enamoramento e Amor" já dá muito pano pra manga.
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“Pela terceira vez Jesus lhe perguntou: Simão filho de João,tu me amas? Pedro entristeceu-se por ele lhe ter dito, pela terceira vez: tu me amas? E respondeu-lhe Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que eu te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas ovelhas."(João21:17)

Quem é ou foi amado já ouviu essa pergunta. “Você me ama?” é uma pergunta comum entre homem e mulher, mãe e filho, amigos. Ainda que não seja verbalizada ela ecoa através de sutilezas nos gestos, no olhar, nas entrelinhas de um diálogo corriqueiro. Mas quando o amor é correspondido nós não cansamos de respondê-la, ainda que pela ducentésima primeira vez, porque intimamente sabemos: aquele que questiona o amor é quem também oferece dádivas. Por que então Pedro se entristeceu?

Há uma corrente de eruditos que acredita que a resposta é filológica. Dizem que a palavra amor nas duas primeiras perguntas de Jesus era o amor agapáo, um amor mais elevado, do tipo que Deus tem por nós, ao que Pedro respondia que amava a Jesus com amor filéo, que seria amor inferior, mais humano, do tipo que temos aos nossos amigos. Pedro então se entristecera porque mesmo tendo dito certa vez que morreria por Cristo, depois de sua negação sabia que ainda não amava a Jesus como era amado por Ele.

Há outra corrente teológica que não crê na inferioridade de um tipo de amor em relação ao outro nem no uso intencional dos dois verbos, especialmente porque Jesus e Pedro teriam conversado não em grego, mas em aramaico, língua em que não haveria distinção no amor mencionado por Jesus e por Pedro. A tristeza deste seria, então, por lembrar-se, após as três perguntas de Cristo, que O negara três vezes.

Quando amamos reorganizamos ao redor da pessoa amada os planos para a nossa vida. E aquilo que será integrado ao novo amor depende do quanto este o permitirá, pois nem sempre os projetos de quem ama e de quem é amado coincidem. O sociólogo Franceso Alberoni elabora bem esse diálogo: “‘Você me ama?’ significa também ‘você aceita entrar no meu projeto?’(...) ‘Amo você’ significa ‘Mudo o meu projeto, venho ficar ao seu lado, aceito seu pedido, renuncio ao que queria, quero, junto com você, o que você quiser’. O ‘Você me ama?’ é, por isso, sempre um pedir alguma coisa que eu desejo, uma renúncia a alguma coisa que você deseja.”

Em qualquer relacionamento esta pergunta é sempre um choque. Às vezes as pessoas constroem suas relações sobre um equilíbrio delicado e protegido. Talvez necessitem de calma e tempo para organizar as coisas, mudar de trabalho, arrumar-se economicamente antes de afirmar seu amor tão plenamente. Pouco a pouco, se o amado souber esperar, ficarão livres e seguros. Mas Jesus pede a Pedro “um ato decisivo, um rompimento brusco com o passado, um mergulho profundo no novo, com o risco de perder tudo o que ama e que deseja organizar ao redor do novo centro de sua vida – seu amor [a Cristo]”. Se abandonar todas as coisas, também terá que se tornar um outro homem. Mas Jesus é enfático: “Apascenta minhas ovelhas”.

O que entristeceu a Pedro, nem eu nem todos os eruditos saberemos ao certo antes de perguntarmos ao próprio apóstolo futuramente. Mas e nós? Quando Cristo põe diante de nós uma prova que pergunta “tu me amas?”, o que sentimos? Pense em Pedro. E como ele, lance fora o medo (I João 4:18) para abraçar o projeto de Cristo em sua vida.

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