domingo, 3 de novembro de 2002

A maior tragédia

Outro dia, eu e umas amigas conversávamos sobre as manias curiosas que as crianças têm. Eu contei, achando-me o mais esquisito dos seres, que quando era criança e minha mãe me batia, eu ia para o meu quarto, ligava o rádio numa música romântica, bem triste, e só então chorava com gosto minha mágoa, que acentuada pela melodia ganhava ares de tragédia. Outra amiga contou que, bem pequena, quando estava chateada ou sentia alguma dor, puxava bastante os próprios cabelos pra dor aumentar e ela chorar com mais força ainda. Mas quem ganhou mesmo foi outra amiga, que relatou, vitoriosa, que quando levava umas boas palmadas da mãe, ia para frente do fogão na cozinha, e ficava olhando fixamente no vidro do forno, o rosto coberto de lágrimas, e então chorava mais, como se estivesse vendo a sua própria dor sendo encenada na televisão.

Não importa o que dizem as estatísticas da ONU: nós sempre vamos achar que nossas próprias tragédias merecem toda atenção. É da natureza humana encontrar sempre algo para queixar-se, e por menor que o problema eleito pareça aos olhos dos demais, ele costuma ser tratado com tamanha ênfase que ganha ares de insolubilidade. "Ai, minha unha quebrou, que desgraça!", e acredite, o sofrimento é verdadeiro e plenamente justificável: "Você tem idéia de quanto tempo esperei esta unha crescer? De quanto gastei em esmalte fortalecedor? Do envolvimento emotivo e cósmico que eu tinha com essa unha?"

Brincadeiras à parte, todos nós, pelo menos uma vez na vida, nos vimos às voltas com algum grande problema, aparentemente sem solução. Daqueles frente aos quais nos sentimos completamente impotentes. Ou ainda daqueles que desabam depois de você ter dedicado um tempo e esforço enorme investindo para que algo fosse adiante, e no fim alguém - que não está realmente interessado na sua dedicação - põe todos os seus planos a perder. Seja qual for a descrição do grande problema, ele é será sempre trágico aos olhos de quem o viveu (mesmo aos olhos daqueles que disfarçam muito bem).

Esta semana, mais uma vez, Deus me falou que no perfil de um cristão não se encaixa bem essa tendência humana de supervalorizar o próprio sofrimento. Na verdade basta um pequeno esforço em mudar o ângulo da visão para perceber que as coisas não são tão trágicas assim. Com um leve movimento rotativo do pescoço, você consegue perceber que todas as pessoas têm problemas, alguns deles muito maiores que o seu. A bem da verdade, com uma olhada mais apurada, você constata que há pessoas com problemas que fariam o seu parecer bem pequenininhos. O maior exemplo disso foi uma jovem garota que conheci faz uns meses, e que tem câncer há três anos. Mesmo podendo reivindicar para si o título de "maior problema do mundo", ela me surpreendeu dizendo ficou muito triste ao encontrar certa mulher bastante resmungona e mau-humorada no pátio de um hospital, que fazia questão de dizer a todos que a interpelavam: "não encha, você não sabe o que é conviver anos com um joelho reumático!". Minha amiguinha apenas sorriu e pensou: "puxa, ela tem um problema maior que o meu: eu tenho que aprender a lidar com a morte, ela sequer aprendeu a lidar com vida!".

E há ainda outro ângulo que convém lançar o olhar antes de dar nosso caso por perdido. Olhando para Cristo, não temos como nos sentir sozinhos. Ele está no comando, sempre! Então pra quê esse desespero? Tudo vai ficar bem, e não é porque sua mãe, namorada ou o Lair Ribeiro falou. É porque Deus está cuidando de tudo. Se você tiver fé para acreditar nisso e deixar que Ele faça a Sua parte, o tamanho do problema diminuirá drasticamente diante de seus olhos.

Há algum tempo li certa frase de um autor que não lembro de jeito nenhum. Até pesquisei bastante para ver se achava ela na internet, mas nem o google me socorreu, então me resta apelar para minha falha memória: "Não se atormente tanto por um problema. O que é a maior das tragédias depois de dez dias?". Você pode escolher ficar com os olhos bem fixos na sua mágoa, decepção, tristeza, saudade, frustração ou derrota. Ou pode olhar em volta e para cima, e renovar a fé na vida. Deus já escolheu que você vai vencer, só espera que você aceite esse fato, para poder torná-lo realidade em sua vida. Enquanto isso acontece, perceba as tragédias alheias e ocupe-se de amenizá-las: é uma forma bastante eficaz de esquecer suas mazelas. Mas não dê muita atenção as próprias tragédias, que elas vão passar, e daqui a dez dias já não serão tão grandes assim, afinal a vida ainda tem que continuar. Ora, a maior tragédia de todos os tempos, durou somente três dias. Mas ao terceiro dia Ele ressuscitou! E agora cá estamos nós, destinados para a vida em abundância!

Uma semana iluminada,

Luciana

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