segunda-feira, 3 de setembro de 2001

Para gostar de graviola

Quanto a gente gosta de uma pessoa, assimila muito dela por "osmose de convivência". Acaba aprendendo a gostar de coisas que antes eram completamente estranhas ao nosso mundinho. Gostar de alguém nos faz reformular conceitos e sentir prazer em permitir-se exceções, até nos darmos conta que não éramos assim tão completos. Faz gostar também do que antes era sem graça, mas só porque não havíamos reparado muito bem, e confesse-se afinal, o sorriso desse alguém nos impede qualquer refutação. "Começamos a ver muito mais no mesmo que sempre vimos e jamais reparamos", diz Artur da Távola. Certa vez, um amigo me falou que foi assim que aprendeu a gostar de cachorros. Semana passada foi minha vez de aprender a gostar de graviola.

Nunca simpatizei com essa fruta. Morei por quinze anos numa casa em cujo quintal habitava um enorme pé de graviola, e hoje sei que veio dele a minha antipatia. Não sei exatamente quando, essa árvore foi atacada por uma praga de besouros que chamávamos "soldadinhos", os quais espalhavam suas larvas brancas e gosmentas por todo o caule e galhos do pé de graviola. E sempre que eu via uma graviola aberta em
minha frente, seu cheiro forte não me apetecia frente a imagem da polpa branca e gosmenta, tão semelhante às larvas dos "soldadinhos". Eu achava aquilo a coisa mais nojenta do mundo.

Mas uns olhos, um sorriso, um copo de suco de graviola, dois canudinhos e afagos estratégicos fazem a gente rever até traumas infantis. Enquanto eu redescobria o sabor da graviola, pensava no velho pé de graviola, que ao final de minhas divagações, se mostrou um motivo nobre – embora não tão doce quanto os argumentos do meu persuasor – para eu aprender a gostar da tal fruta gosmenta.

Lembrei que por causa daquela praga de "soldadinhos", minha mãe resolveu fazer uma poda drástica, e o pé de graviola perdeu folhas e galhos. Porém, pouco tempo depois, novas folhas cobriram-no. Nova poda foi feita, e seguida de muitas outras, cada vez mais violentas, até resumir a árvore a um tronco liso. Da última vez demorou mas...
ele renasceu de novo! E agora totalmente livre das larvas, exibindo graviolas graúdas, como se nada tivesse sofrido.

Pensando sobre esse potencial de regeneração, eu cheguei até o próprio homem, e conclui que fomos criados com uma porção generosa dele. Perdemos a vida eterna em Adão, ganhamos o dom da regeneração em Jesus Cristo. Sua ressurreição é a prova de que a humanidade tem em si a vocação para ser transformada, refeita em cada perda que o pecado reclama no espírito e coração de cada filho de Deus.

Vida, amor, justiça, paz, felicidade: não se pode falar em perda com relação a essas coisas, Deus as fez com a renovação latente. Mesmo que a dor pareça exigir a sensação de amputação, um olhar de fé vê o que foi arrancado ressurgir, em maior glória, como é a vitória de tudo aquilo que se pensava acabado, cuja força se subjuga. Quem pode mensurar a força e beleza da vida, do amor, da justiça e da
felicidade recriadas pelas mãos de Deus?

Me vi diante de uma linda verdade: não há nada nesta vida que possa nos ser tomado, sem que Deus nos devolva em completa renovação e superioridade. Uma crença, um sentimento ou um relacionamento são também obras da criação e recriação de Deus. Por isso não importa o tamanho do vazio ou a ilusão da ausência: entregue a Ele o que você julga perdido. Deus restaura tudo que reconhece como de Sua posse exclusiva. E não apenas concede a renovação, mas com ela, veios de sua Majestade, Exaltação e Eternidade.

Uma semana iluminada!

Luna

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