quinta-feira, 5 de março de 2009

Feliz dia da música clássica

Hoje, revirando alguns escritos antigos, achei uns devocionais que escrevi inspirada por obras musicais em específico. E como fiquei sabendo pelo blog do Joêzer que hoje é oficialmente dia nacional da Música Clássica, pesquei esse texto aí embaixo para colocar aqui. Foi escrita em 2001, quando eu começava a adentrar o "magnífico" mundo da música erudita. Sabia tão pouco da técnica, da teoria e dos esnobismos que cercam esse mundo! Não que hoje eu saiba alguma coisa, mas digamos que, na faculdadede Música adquiri um certo conhecimento do bem e do mal.
Hoje estou especialmente triste e bastante desanimada. Recorro a lembranças da minha obra sacra "erudita" preferida, o Messias de Handel (sim, o Messias, aquele do Aleluia). Poderia citar obras muito mais "eruditas" e até mais "sacras", poderia ter escolhido um devocional menos ingênuo e piegas. Mas esta preferência é também uma necessidade de consolo. Uma vontade de colher afeto na Beleza que me toca. Não acho que recuperarei a comoção tão autêntica, característica desta época de minha vida. Mas a Música sempre aponta uma claridade.

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Eu já falei para vocês o quanto gosto de Handel? Só não afirmo que ele é meu compositor favorito porque também sou fascinada pela exuberância de Bach, a expressividade de Vivaldi, e a mediocridade de Mozart (o garante minha querida e saudosa amiga Renata). Se a minha vida pudesse ter trilha musical (tenho esta neurose), George Frideric Handel fulguraria em destaque nos créditos, tanto me identifico com sua música.

Eu estava aqui prestando atenção numa das muitas belas árias compostas por ele, que também é uma obra-prima teológica pelo simples ajuntar de dois versículos. A voz de uma contralto (as contraltos são formidáveis) desabrocha no meio de violinos e canta: "Como pastor ele apascentará o seu rebanho; entre os seus braços recolherá os cordeirinhos, e os levará junto ao peito; as que amamentam, ele as guiará mansamente." (Isaías 40:11). Chegue mais perto e repare: o pastor agora está sozinho, e tem o olhar fixo no horizonte, onde busca uma ovelha. Por um momento ele interrompe a caminhada, para e suspira. A voz soprano que estava agachada a contemplar a flor da voz contralto, toma-a nas mãos, levanta-se três tons acima e diz: "Ide a Ele, todos os que estais cansados e oprimidos, e Ele vos aliviará.. Tomai sobre vós o Seu jugo, e aprendei dEle, que é manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas." (ver Mateus 11:28, 29).

E agora eu ouso ir além, fazendo um arranjo nessa harmonia tocante. Quero ver a ovelha que o pastor procura. E sabe o que vejo? A ovelha de Lucas 3:4 – 6, aquela famosa ovelhinha perdida.
Quero que você imagine-se no lugar daquele pastor. Ele amava suas ovelhas, e tanto cuidava, dava carinho e atenção que estas já lhe conheciam pela voz. Mas uma dessas ovelhas sumiu, deixando-o preocupado, temeroso e decepcionado. Imagino esse pastor andando pelo deserto, fazendo sua voz ecoar nas montanhas pedregosas em busca de sua preciosa ovelha perdida. Mas parece que quanto mais a busca, mais a ovelha se distancia dele. O sol lhe queima a face ansiosa... ele começa a sentir sede e fome. Seus pés doem, mas ele continua a andar e – estranho – seu semblante transmite ânimo inabalável, sua voz firme não deixa de ser doce enquanto diz: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei... e achareis descanso para as vossas almas".

Consegue perceber que enquanto procura a sua ovelha perdida, o pastor chama para si não só ela, mas todos os que estão cansados e oprimidos? Pode imaginar que, naqueles vales desérticos talvez haja outras ovelhas perdidas precisando dos braços amoráveis do pastor, onde possam descansar junto ao seu peito? Nota que mesmo fatigado da busca, decepcionado com a perda de sua querida ovelhinha, e sem certezas de que tornará a vê-la, ele persiste em ser pastor acolhedor a toda criatura que cruze seu caminho? Você enxerga que este pastor não se ocupa das próprias lágrimas, mas persegue com teimosia um alvo, sem jamais duvidar de sua capacidade de amar, sem questionar se vale a pena tamanha jornada pedregosa por causa de uma simples ovelha?

Olhe para sua vida e pense nas coisas que você perdeu. Talvez você saiba exatamente o que faz falta, a saudade precisa do que um dia foi tão seu, tão você, a dor de uma ausência bem conhecida: algo que se perdeu de dentro de você. Talvez você nem tenha parado para se dar conta das perdas que carrega como fardo vida afora. Algumas pessoas preferem não pensar muito na forma como perderam a pureza ingênua, a esperança de melhorar as coisas erradas ao redor ou em si mesmo, a capacidade de amar e confiar sinceramente no ser humano, até mesmo a crença num Deus presente e amoroso e num novo mundo transformado, muito embora essas perdas se acumulem formando rugas no espírito de quem as leva.

O que eu desejo para mim e para todos aqueles que sofreram grandes perdas e decepções, é que assumam a postura daquele pastor. Não desistir de ir atrás do que se perdeu. Se isso lhe pertencia, era parte de você, então é extremamente precioso e deve voltar ao seu verdadeiro lugar. Não podemos nos sentir felizes se estamos incompletos, portanto continue procurando o amor, a amizade, a confiança, a fé, a crença. Se você fizer isso, vai estar você mesmo voltando para o seu verdadeiro lugar, pois o caminho pedregoso dos que lutam por reconquistar a felicidade, vai dar na Nova Terra, onde finalmente encontraremos tudo que um dia fomos, e que se perdeu nesses milênios de pecado.

Continue buscando. E não siga cabisbaixo e murmurante, não se isole no vale de sua dor; vá oferecendo amor e sorrisos a todos que cruzarem seu caminho. Enquanto procura sua ovelha perdida, dê o abrigo de seus braços aos que seguem cansados e oprimidos, seja alívio e descanso para os outros que estão perdidos. Você estará recuperando muitas ovelhas preciosas que a humanidade perdeu. Seja manso e humilde de coração, e você já terá achado algo muito importante: companhia para dividir o peso do jugo, e ajuda para buscar e comemorar a volta da sua ovelhinha.

Uma semana cheia dessa melodia luminosa,

Luna

Um comentário:

Marco Aurelio Brasil disse...

Queria ler ouvindo a música.