domingo, 13 de maio de 2001

Amigos e afins

Oi!

Será que vocês têm percebido que eu ando numa fase meio minimalista?... reparei nisto esta semana, enquanto ouvia uma música da Annie Lennox que diz: "the language is leaving me". De fato, as respostas a maioria de meus e-mails pessoais têm, inacreditavelmente, se reduzido a poucas linhas, meu repertório de palavras usadas na
faculdade e no trabalho cabem em menos linhas ainda, e tenho me surpreendido usando uma lógica de raciocínio tão objetiva, que tenho começado a sentir saudade de minhas divagações desvairadas.

Acho que esta rotina maquinal tem me desumanizado um pouco. Ou simplesmente me deixado mais prática... mas quando as conversas com os amigos começam a acontecer apenas em lugares cada vez mais bizarros como dentro do ônibus, no intervalo de um semáforo fechado, ou na fila de um banheiro público, deve haver algo errado, concorda?

Estou preocupada! Se eu continuar assim, em breve estarei usando código morse ao telefone, alfabeto de bandeiras para falar com minha família e comprando CDs de Philip Glass!! Nãaaaaoooooo!!!!

Ainda estou me acostumando a estas faces superficiais do mundoadulto. Já que para tocar a vida há que se alterar necessariamente a vida social, eu espero ao menos que consiga manter um bom grupo de afins. De modo que mesmo ausente (eu ia usar a locução "um pouco", mas tenho de ser sincera...), estes amigos ainda consigam entender o quanto os amo, mesmo em meu silêncio, algo assim como uma telepatia
que os dê a certeza que queria ter mais tempo para me demorar neles e nos meus sentimentos. Não estou tentando me escusar da culpa que tenho, acredito que administrando melhor meu tempo, conseguiria um pouco mais do que tenho feito neste sentido... mas até lá eu confio no poder da afinidade, que faz os seres perceberem a presença do outro, e sentirem com ele, e partilharem a existência acima de qualquer tipo de distância. Uma afinidade que tem o poder de suprimir ausências: quando você vê a criatura depois de dez anos, retoma o convívio com o mesmo sentimento de felicidade, no ponto exato onde ele parou.

Entendo a necessidade que nós temos de gestos que demonstrem concretamente o que sentimos, mas olha, eu ainda acho que a afinidade é mais importante. Isso eu vim entender profundamente outro dia quando liguei para meu amigo Tibi. Depois de vários meses sem nos falarmos, eu reconheci sua voz imediatamente, e ouvi dele que tinha ligado no momento exato em que ele estava precisando. Aquela telepatia de que lhe falei ali em cima. É ela que faz a distinção entre meus amigos verdadeiros e os colegas passantes. Não que a presença física seja dispensável – eu sou uma firme defensora dela –, o que tento expressar é que ela não é o mais importante, o substancial é sua plácida expectativa.

Sabe, já que o assunto é amigos... eu bem que gostaria que Jesus viesse almoçar de vez em quando aqui em casa. Prepararia até meu prato especial: a melhor lasanha congelada de caixinha da história da culinária. Queria encontrar com ele depois do trabalho para um passeio, ou uma conversa tomando o suco sensacional da Dona Sônia na
lanchonete dela. Seria bem legal virar uma noite conversando com Ele, como as velhas noitadas na casa da Du, sem compromisso com os livros de Direito Internacional (argh!). Eu tenho certeza que Ele também adoraria estar presente desta forma. E é esta certeza que me anima a esperar o dia de vê-lO, para continuarmos nosso convívio do ponto onde parou no Édem! O nosso tipo de amizade se distingue como verdadeira exatamente pelo fato de eu sentir que posso contar com Ele, mesmo sem Sua presença física. Até Seu silêncio é amável, a certeza que Ele está ao meu lado transcende essas coisas tangíveis. E nem te conto com que graça nosso amor dispensa o Aurélio! Meu contato com Ele não se resume apenas a conversas entre dois distantes, mas durante todo o dia, somos onipresentes um para o outro, até naqueles momentos em que o amor vira um leve estado de dormência...inconsciência antenada, sonambulismo parabólico. :-P

Afim é alguém assim, sem fim, de quem se está sempre a fim. Uma amizade dessas acaba se tornando forte a ponto de moldar toda uma vida, de modo a fundí-la à outra. Ser e estar estão tão vinculados como no significado do verbo to be. Amigos afins, como os que Jesus me deu aqui, e que Ele mesmo é para mim, são o motivo de nunca me faltar motivo para sorrir. Durante esta semana que se inicia, permita-se reconhecer mais uma vez o valor de cada um de seus afins, viver com mais atenção estas afinidades – você não precisa de tempo para isso, só de um pouco de espaço dentro de si mesmo. Vamos assimilar a tática divina de deixar nossos afins sentirem (e sentirmos nós
mesmos!), do ato mais minimalista até o exagero de uma expressão super-luciânica-hiperbólica-megalomaníaca-típica, a voz telepática de alguém dizendo: te amo, te amo, te amo, tum tum...

Uma semana iluminada!!

Luna

Ps.: Minha intenção era, verdadeiramente, fazer uma meditação, mas meu teclado insistiu em fazer poesia. Bem, ao menos matei a saudade de minhas divagações desvairadas...

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